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Lady Bird

 

Género: Comédia/Romance

Duração: 93 minutos
Ano de lançamento: 2017

Diretor: Greta Gerwig

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“Lady Bird” poderia ter sido um completo cliché, ao invés disso foi uma viagem emocional repleta de desejos, ânsias e memórias.
O filme começa com um primeiro plano de Lady Bird (Saoirse Ronan) e da sua mãe Laurie (Marion McPherson) deitadas, de olhos fechados, uma em frente à outra. Esta primeira cena é um presente antecipado e um momento de proximidade e intimidade quase único ao longo da história.
Seguidamente, somos transportados para uma roadtrip, onde mãe e filha ouvem um audiolivro de forma bastante emotiva. Esta ligação entre as duas é corrompida de imediato por uma discussão bastante intensa e crua. As personagens atropelam-se a falar com interrupções desorganizadas, o que compreende um reflexo fiel do mundo real e enfatiza um dos pontos fortes do filme, os diálogos autênticos e legítimos.
Tanto a cena no carro como as cenas seguintes no Mary Catholic High School são diretas e eficientes na apresentação do cenário em que as personagens deambulam.
Algo que me cativou neste filme foi o colégio católico incomum. Enquanto ateia, facilmente, aceitaria a ideia de um ambiente conservador e asfixiante, contudo não foi essa a tendência. O colégio embora religioso reúne personagens interessantes como a freira Sarah Joan (Lois Smith) bem-humorada e o padre Leviatch (Stephen McKinley Henderson) perspicaz e depressivo. Para além disso, momentos como aquele em que a protagonista e a sua melhor amiga Julie (Beanie Feldstein) comem hóstias como se estivessem a comer pipocas, trazem um toque de frescura e boa disposição ao filme. Ademais, uma vez que a personagem principal se encontra em Nova York é dentro de uma igreja que ela procura conforto o que realça as influências da sua própria educação.
A narrativa desenrola-se no ano de 2002 e, embora a realizadora Greta Gerwig tenha deixado explicito que não se trata de um retrato autobiográfico, ela também revela que cresceu em Sacramento. A influência deste fator transparece na estética através da temperatura de cor mais quente, da imagem com ruído e de uma forte inclinação para o visual analógico, “como se fosse uma memória”.
Mais do que uma história sobre uma adolescente problemática e rebelde, esta película é uma narração sobre os pequenos detalhes fugazes da vida. A relação de mãe e filha é o foco principal que nos faz questionar a forma como comunicamos amor. O próprio trauma é uma pincelada explicativa das mazelas que o passado nos deixa. Numa das conversas adversas entre as duas, Marion admite que a sua mãe era alcoólica e que a tratava mal. Entendemos então a dificuldade que a enfermeira (ironicamente da área da psiquiatria) tem em demonstrar afeto. A cena em que ambas escolhem um vestido para o Dia de Ação de Graças é perfeitamente explicativo disso: após mais uma discussão a mãe de Christine encontra-lhe o vestido perfeito e, no silêncio da noite, ajusta-o para que fique perfeito na filha. Não existem palavras generosas durante esta conjuntura de momentos, mas sim gestos de cuidado e preocupação.
A minha citação favorita durante o filme acontece, precisamente, entre estas duas personagens: “No, I mean, I just, I wish that you liked me. / Of course I love you. / But do you like me?” – um retrato nuo de um amor profundo que não é obrigado a fingir. As cartas de Marion que são entregues a Lady Bird pelo seu pai, no fim do drama, vêm reforçar este medo, receio e distância que existe ao longo do filme.
O desenvolvimento da personagem interpretada por Saoirse está deveras bem escrito. O momento a caminho do baile de finalistas é o ponto de viragem na personalidade de Lady Bird e daí para a frente existe uma junção de circunstâncias que nos indicam o amadurecimento da mesma. As pequenas conquistas e ações, como ser aprovada no exame de código, trabalhar, arrumar o quarto, etc., servem como termo de comparação com as partidas e desobediências do início e evidenciam a ascensão da adolescente.
A recriação da primeira cena, em que mãe e filha estão deitadas é reproduzida no final, mas apenas com Christine e é aqui que, para mim, encontramos a verdadeira mensagem do filme que se prende com esta vulnerabilidade da vida e da sua urgência em acontecer. O filme é composto por cenas rápidas e transições, por vezes, brutas que nos fazem ficar quase sem fôlego. Isto é propositado porque nos indica que nada é permanente e que quando nos apercebermos já passou. A vida é hoje e “Lady Bird” recorda-nos disso.

Inês Saldanha

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